O Ordenança de Oficiais

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        O ordenança de Oficiais foi uma figura que existiu durante um longo período em meio à administração das Polícias Militares de todo o Brasil, em particular na da Paraíba. O termo é mais conhecido em doutrinas religiosas, mas aqui tem um significado específico. Era um policial, geralmente um Soldado, que ficava à disposição de um Oficial para auxilia-lo em poucas atividades relacionadas a serviços da Corporação, como o de estafeta, por exemplo.

     Mas na maior parte do tempo o Ordenança servia para executar trabalhos do interesse particular do Oficial e seus familiares, inclusive algumas atividades domésticas. Não era rara a execução de atividades como carregar balaios de feiras, cuidar de jardim, dar banho em cachorro, lavar automóveis, servir como vigilante da casa do Oficial, conduzir crianças para o Colégio, e outras coisas dessa natureza. Essa situação tornava o Ordenança em um mero serviçal, totalmente subserviente. Era evidente o abusivo desvio de função.

    Havia casos em que o Oficial e o Ordenança eram reformados, mas a relação de subserviência continuava. Foi o caso, por exemplo, do Major Eurivaldo Caldas que foi reformado, mas o seu ordenança permaneceu a seu serviço.

     Aos poucos essa prática foi diminuindo, mas até meados da década de 1980, já com o progresso material da PM da Paraíba, alguns Oficiais ainda faziam uso de veículos da Corporação para a execução de transportes dos seus filhos para o Colégio. Mesmo com raridade, ocorria também o transporte de esposas de Oficiais para Salão de Beleza e outras coisas desse gênero.

      Era o caso de uma Viatura (e seu Motorista) ficar à disposição de um Oficial para o seu uso funcional, mas que era empregada para serviços particulares. Era a modernização do ordenança. Em nossos dias, situações dessa natureza podem ter sido reduzidas, mas não acabaram inteiramente.

        Essa prática teve origem no que era denominado de Administração Patrimonialista na qual os dirigentes de serviços públicos não faziam distinção entre o patrimônio público e o privado.

      Embora essa forma de administração fosse própria dos Governos Absolutistas, e que, em princípio, foi abolida com a Revolução Francesa, ela foi aplicada no Brasil durante todo o período Imperial e teve continuidade no regime republicano em muitos setores da administração pública.

      No artigo 12º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que formalizou os ideais dos revolucionários franceses, encontramos não só a importância que foi dada à existência de uma instituição policial, como também a preocupação com o seu emprego, de forma a se evitar que ela fosse utilizada para proveito próprio dos seus integrantes.

    Esse dispositivo tem a seguinte redação:

          Art. 12.º A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada;

    No caso da PM da Paraíba, pelo menos até meados da década de 1960, essa prática era institucionalizada com regulamentação através de notas publicadas no Boletim Interno da Corporação, como a que a seguir transcrevemos em razão da original está quase ilegível.

      Nota publicada no Boletim Interno do Comando Geral da Polícia Militar da Paraíba do dia 30 de maio de 1967.

”Aos Comandantes de Batalhões e Chefes de Serviços – Transcrição de Nota.

Este Comando determina que os Oficiais desta Corporação só poderão ter a sua disposição uma praça, de acordo com normas anteriores deste Comando.

Exceção dessa Ordem só se fará com visto do Comandante Geral e sua respectiva publicação no Boletim Interno. Os Comandantes de Batalhões e Chefes de Serviços, bem assim os Comandantes de Companhias Isoladas estejam atentos a observação desta norma, recolhendo ao Quartel os ordenanças a mais do número permitido aos Senhores Oficiais, ficando sob inteira responsabilidade destes Comandantes o fiel cumprimento desta ordem. – Nota do Gabinete do Comandante Geral –“

       Pelo conteúdo dessa nota parece que todos os Oficiais poderiam ter um Ordenança. Mas na prática não era bem assim. Essa prerrogativa era só para os Oficiais que ocupavam determinadas funções, como Chefes de Sessões do Estado Maior, Comandantes de Batalhões e outras atividades desse nível.

    Nota-se também que existiam Oficiais que tinham mais um ordenança.

    Outra observação é que a ordem era para recolher ao Quartel as Ordenanças que excedessem ao número permito, ou seja, esses policiais não tinham atividades na caserna.

     Alguns Oficiais, mesmo ocupando funções de relevo na Corporação, não tinham ordenanças, ou por não quererem ou por não terem o necessário prestígio junto aos escalões superiores para a obtenção desse privilégio.

       Muitos herdeiros de Oficiais que se beneficiavam desse tipo de serviço, se lembram com saudades daqueles tempos.

                    Nota publicada no Boletim do Comando Geral da PM/PB no dia 30 de maio de 1967
NOTA PUBLICADA NO BOLETIM DO COMANDO GERAL DA PMPB
Veja também Cabo Zé Rodrigues, o estafeta A origem da Continência

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