O desastre de Água Branca

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     O desastre de Água Branca foi um episódio ocorrido em 1930 durante as lutas que a Polícia Militar da Paraíba, na época com a denominação de Força Pública, enfrentou contra grupos de fanáticos armados, liderados pelo Deputado José Pereira.

    Os confrontos começaram no dia 1 de março de 1930, dia das eleições Federais, quando grupos de fanáticos armadas impediram as votações em diversas seções eleitorais na cidade Teixeira, na região no alto sertão paraibano. Os pesquisadores desse tema estimam que esses grupos de cangaceiros  totalizavam mais  de 600 homens.

     Zé Pereira era um recente adversário político de João Pessoa, Presidente da Paraíba, como era denominado o Governador do Estado na época.  O que Zé Pereira pretendia com essas lutas era provocar um clima de desordem pública no Estado que justificasse uma intervenção federal na Paraíba, com a consequente queda de João Pessoa.

     Para essa luta Zé Pereira recebeu ajuda em dinheiro, armas e munições do Governo Federal. O Presidente da República era Washington Luís,  que também era adversário político de João Pessoa, desde o episódio que ficou conhecido como o dia do nego, (29 de junho de 1929).

  O texto do telegrama que gerou o rompimento de João Pessoa com Washington Luis. "Paraíba, 29-julho-1929 Deputado Tavares Cavalcanti: Reunido o diretório do partido, sob minha presidência política, resolveu unanimemente não apoiar a candidatura do eminente Sr. Júlio Prestes à sucessão presidencial da República. Peço comunicar essa solução ao líder da Maioria, em resposta à sua consulta sobre a atitude da Paraíba. Queira transmitir aos demais membros da bancada essa deliberação do Partido, que conto, todos apoiarão, com a solidariedade sempre assegurada. Saudações: João Pessoa, Presidente do Estado da Paraíba."  

       O Governo começou a se mobilizar para combater esses grupos. Inicialmente um contingente de 100 policiais, sob o Comando do Tenente João Costa foi reunido na Cidade de Patos e de lá saiu, a pé, em direção à vila de Teixeira onde ocorreu o primeiro combate, com a derrota dos fanáticos, que fugiram para o Distrito de Imaculada, na direção de Princesa.

    Depois desse combate João Costa, que conhecia bem a região e seus os adversários, elaborou um plano de ação para a luta e encaminhou ao Comando Geral. A ideia era atacar Princesa, onde se refugiavam os grupos de desordeiros depois das ações em localidades vizinhas.

    Seriam formados três efetivos policiais, que seriam denominados de Colunas, cada uma com aproximadamente 250 homens. Uma delas partiria do Distrito de Manaíra, outra de Santana dos Garrotes e uma terceira, que era a de João Costa, saindo do Distrito de Tavares.  Esses pontos ficavam a menos de 20 quilômetros de Princesa. Os ataques seriam simultâneos.

 O Plano de João Costa

    O efetivo da Força Policial na época não era suficiente para montar esse plano e manter os Destacamentos das cidades em todo Estado, sua principal função Constitucional.

       Por esse motivo foi criado um Batalhão Provisório, no qual as pessoas eram incluídas só para participar dessas lutas e no final seriam excluídas.

    O Capitão Irineu Rangel, um Oficial da reserva, que durante muitos anos comandou patrulhas volantes em perseguição aos grupos de cangaceiros, foi convocado para comandar esse Batalhão, que ficou sediado na cidade de Piancó, no alto sertão do Estado.

      Os confrontos duraram do início de março ao final de julho, com muitas mortes de ambos os lados. Mas aqui vamos enfocar o episódio no qual ocorreu a maior quantidade de mortes de policiais, evento que ficou conhecido como o desastre de Água Branca.

       As inclusões no Batalhão Provisório começaram, simultaneamente, com o ingresso de novos Soldados no Quadro Efetivo.  Esses alistamentos eram feitos em Campina Grande e na Capital, que na época ainda era denominada de Paraíba. (Só no dia 4 de setembro de 1930 essa cidade recebeu a denominação de João Pessoa).

        A partir de meados de março, efetivos de 40 a 60 homens eram embarcados, quinzenalmente, para Piancó, onde eram organizadas as Colunas.  Esses efetivos tinham baixa escolaridade e não recebiam qualquer instrução.

    Aos poucos as Colunas iam sendo montadas. Mas os grupos de Zé Pereira, através de ataques furtivos, dificultavam o posicionamento das Colunas nos locais previstos no plano de João Costa.

    Depois de muitos confrontos, a Coluna de João Costa, já com cerca de 200 homens, chegou ao Distrito de Tavares e ali ficou aguardando que as outras colunas se posicionassem. Com a demora do apronto das outras Colunas, João Costa, que havia sido promovido a Capitão por bravura em decorrências das últimas lutas, solicitou um reforço para fazer o ataque só com a sua Coluna.

     O pedido chegou ao Coronel Elísio Sobreira, que era o Comandante Geral, e o reforço pretendido começo a ser preparado.

       Na madrugada do dia 31 de maio, um efetivo composto por 103 Praças, sob o Comando do Tenente Manoel Marinho, transportado em Caminhões, se deslocou da Capital com destino a Tavares. Em Campina Grande o Comando desse efetivo passou para Francisco Genésio dos Santos, um civil Comissionado no Posto de 2º Tenente, portanto, e, portanto era uma pessoa sem o preparo técnico necessária para a função que assumiu.

     Essa tropa passou por Taperoá, Teixeira e Imaculada, chegando a Água Branca ao anoitecer do dia 31 de maio.  Ali a tropa acantonou. Uma pequena parte se acomodou em uma pensão e a maioria dormiu na calçada da Igreja, localizada nas proximidades da Pensão.

    No dia seguinte, 1º de junho, a tropa reiniciou a marcha.

     Aproximadamente a 600 metros da área urbana daquele Distrito, em meio a um matagal, existiam cercas de pedras justapostas, com um metro e meio de altura, nos dois lados da estrada carroçável. De maneira que  formava um corredor com cerca de 100 metros de cumprimento por 4 metros de largura. Era o início da estrada antiga que ligava Água Branca a Tavares.  Esse tipo de cerca era utilizado por criadores de bode, que era uma forma segura de impedir que aqueles animais fugissem para as propriedades vizinhas.

     Quando o comboio entrou nesse corredor, grupos armadas de Zé Pereira colocaram galhos de árvores na frente do primeiro caminhão e por trás do último, deixando a tropa encurralada.

    Do outro lado das cercas, o grupo de fanáticos seguidores de Zé Pereira,  abriu fogo contra a indefesa tropa. Foi um verdadeiro massacre.  Poucos policiais escaparam, correndo mata adentro. Os caminhões foram incendiados.  Muitos morreram ainda embarcados.  Em seguida o grupo de fanáticos fugiu, a cavalos, fazendo grande algazarra.

    Moradores locais sepultaram dezenas de corpos carbonizados nas proximidades da Igreja. Eram mais de 5 corpos em casa cova.

   No local da emboscada, a marca do fogo ficou no chão durante muito tempo. Ali, dias depois, moradores ergueram uma pequena capela e colocaram uma grande cruz de madeira e o local ficou conhecido como a cruz do caminhão.

     No dia 2 de novembro daquele ano (1930), moradores das redondezas fizeram visitas a essa capela e ali colocaram ex-votos, o que indica que estavam pagando promessas.  Com o passar do tempo a quantidade de visitantes foi crescendo, chegando a formar verdadeiras romarias, que contavam inclusive com a participação do Padre da paróquia local.

      A cerca de pedras existiu, pelo menos, até 1990, quando visitei o lugar pela primeira vez. Com o desenvolvimento da cidade, foram construídas casas de elevando padrão nas proximidades do local de emboscada. As romarias foram diminuindo e quase não mais existiam, quando. há alguns anos,  o Poder Público Municipal restaurou  a capela e investiu tornando-a em uma tração turística da cidade.

     Durante aquele período todos os meios da Corporação estavam voltados para aquelas lutas, o que desfalcou as atividades burocráticas e, por conseguinte, fragilizou os registros relacionados com o controle do efetivo.     Assim,  nos arquivos da Polícia Militar só há o registro da tropa, formada por 103 Praças, que seguiu para essa missão, e, dias depois, a anotação de 13 feridos naquele episódio e de mais 30 que se apresentaram depois e foram considerados como “destroçados” do desastre de Água Branca.

      Não há registro da quantidade ou nomes dos mortos. O Governo, por certo, não tinha interesse em divulgar esses dados para não afetar o moral da tropa. A imprensa Oficial nada publicou a respeito desses fatos.

    Considerando o efetivo que seguiu para aquela missão, (103 homens) e dele subtraindo os feridos e “os destroçados”, termo utilizado nos documentos oficiais para indicar os sobreviventes sem ferimentos graves, (13 +30 = 43) restam 60 homens. Seria esse o total de mortes e desertores.

       Porém, muitos dos feridos e dos “destroçados” não constam da relação dos embarcados na Capital naquele dia.  Assim, há evidências de que no momento daquela emboscada existia efetivo que foi integrado à tropa depois da sua saída da Capital. Isso nos leva a crer que a tropa chegou a uns 130 homens. Mas, só conseguimos listar  12 mortos naquela emboscada. Estimamos que esse número, no mínimo chega a 70 policiais. Levantar dados complementares sobre esses números é um desafio para os pesquisadores desse tema.

       Mesmo depois desse desastre, a luta continuou. No final de junho as Colunas, com cerca de 800 homens, se posicionaram nos pontos estabelecidos no Plano de João Costa e ficaram aptas para o ataque final.

     Mas, João Pessoa ficou tentando fazer Zé Pereira se entregar para evitar as muitas mortes que ocorreriam se ocorresse o ataque final.

     No dia 26 de julho João Pessoa foi assassinado em Recife em razão de fatos que não guardam relação direta com as causas das lutas em Princesa, embora essa questão seja polêmica.

     A morte de João Pessoa virou bandeira política dos adversários do Governo Federal, e fortaleceu a propaganda de uma revolução que já estava em marcha. Com isso a luta de Zé Pereira perdeu o objeto e muitos dos seus seguidores se dispersaram.

      Pressionado pela imprensa e pela opinião pública, já em clima de revolução, o Governo Federal resolveu intervir e uma Companhia do Exército sob o Comando do Capitão João Facó, no dia 17 de agosto, invadiu Princesa sem encontrar  resistência, pois Zé Pereira e o restante dos seus seguidores fugiram.

    A luta acabou. O efetivo da Força Pública que fez parte dessas lutas se recolheu para a Cidade de Piancó, sede do Batalhão Provisório, onde ficou até o início da Revolução de 4 de outubro, quando se integrou às  Forças Armadas e prestou relevantes serviços a essa causa.

  Veja também   A Campanha de Princesa: O nego, a morte de João Pessoa, o nome da cidade e a bandeira.

       

A PM da Paraíba nas lutas contra a Coluna Prestes   A participação da PM da Paraíba nas lutas contra a Revolução Paulista de 1932    

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