Os Comandantes da PM da Paraíba durante o Governo de Osvaldo Trigueiro

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 Os Comandantes da PM da Paraíba durante o Governo de Osvaldo Trigueiro vivenciaram os reflexos do contexto  político do período anterior, que preparou o país para o retorno à democracia e que, na Paraíba,   foi marcado por muitas e rápidas mudanças na cúpula política do Estado. Aqui vamos abordar esses fatos dando continuidade à série de relatos que estamos fazendo sobre os Comandos desse Corporação.

Veja o vídeo https://www.youtube.com/watch?v=Ito13rIkdss

Em dois artigos anteriores comentamos os fatos mais relevantes  ocorridos durante os Comandos da PM da Paraíba de 1912 a 1945. Agora vamos focar a nossa atenção nos Comandos de 1947 a 1951, que foi o período do Governo de Osvaldo Trigueiro de Albuquerque, marco inicial da redemocratização na Paraíba e no país, depois da longa ditadura de Getúlio Vargas.

Com a deposição de Getúlio, no dia 29 de outubro de 1945, teve início, em todo país, o processo de redemocratização, iniciando com a eleição e instalação da Assembleia Nacional Constituinte.   - A era ditatorial de Getúlio Vargas

Nesse contexto, no decorrer de 1946 ao início de março de 1947, a Paraíba teve três Governadores na condição de Interventores.  Primeiramente tivemos Severino Montenegro, Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça, ligado à UDN, que presidiu as eleições do Estado para a Assembleia Nacional Constituinte, e ficou no poder até 12 de março de 1946.

Na mesma data Odon Bezerra Cavalcante, político ligado ao PSD, foi nomeado Interventor pelo Presidente Eurico Gaspar Dutra, e ficou  nessas funções até 20 de setembro quando pediu exoneração para ser candidato a Deputado.

José Gomes da Silva, também nomeado por Dutra, partidário da UDN, substituiu Odon Bezerra, e Governou até 4 de março de 1947, quando Osvaldo Trigueiro, Governador eleito, tomou posse.

Como se percebe, ocorreram breves e sucessivas alternâncias na cúpula política do Governo, o que, em consequência, acarretavam mudanças na administração pública.

Durante aqueles 14 meses a PM da Paraíba teve seis períodos de Comando. Elias Fernandes e José Maurício da Costa, Oficiais da Corporação, comandaram duas vezes cada. José Arnaldo de Vasconcelos, Oficial do Exército, comandou por 10 dias, e Ivo Borges, também do Exército, que passou 10 meses nessa função.

Portanto, foram períodos muito curtos e afetados pela instabilidade política, pelo que não temos registros de fatos relevantes a comentar sobres esses comandos.

 Apenas como curiosidade anotamos a explicação do fato de o Coronel José Arnaldo Cabral de Vasconcelos ter exercido essa função por apenas 10 dias naquele período. (21 a 31 de janeiro de 1946).

O fato é que ele tinha comandando a Corporação durante 4 meses e 20 dias (16 de agosto de 1938 a 6 de janeiro de 1939).  Ocorre que para efeito de contagem de tempo de arregimentação, (tempo de comando)  nos processo de promoção no Exercito, ele precisava de, no mínimo, de 6 meses de comando.

Assim, no começo de 1946, José Arnaldo era Chefe de Polícia na Paraíba e foi nomeado, no dia 21 de janeiro para, cumulativamente, Comandar a PM a contar de 30 de novembro de 1945.  Dessa forma, ele adicionou os 30 dias de dezembro de 1945 e mais os 10 dias de janeiro de 1946, o que completou os 6 meses de comando que precisava.

Depois ele voltou ao Comando, em 1949, o que será  comentado mais adiante.

  1. Comandos durante o Governo de Osvaldo Trigueiro de Albuquerque

Em janeiro de 1947 ocorreram eleições nos Estados para Governador, Senador e Deputados Estaduais Constituintes. Na Paraíba, a União Democrática Nacional (UDN) foi a grande vencedora, disputando com o Partido Social Democrático (PSD), elegendo o Governador, o Senador (Só uma vaga em disputa) e a maioria na Assembleia. O Governador eleito foi Osvaldo Trigueiro de Albuquerque, um dos homens mais cultos dos que já governaram a Paraíba.

Osvaldo Trigueiro, natural de Alagoa Grande, Paraíba, tinha sido Prefeito Interventor de João Pessoa (1937), e depois de Governador foi Deputado Federal, Embaixador, Procurador Geral da República, Ministro do Superior Tribunal Eleitoral e Ministro do Supremo Tribunal Federal, onde foi Presidente.

O vice Governador Eleito foi José Targino, que assumiu o Governo a partir do dia 1 de junho de 1950, quando Osvaldo Pessoa se afastou para ser candidato a Deputado Federal.

Durante esse governo a PM teve dois Comandantes: Elias Fernandes, em dois períodos (10 de março de 1947 a 22 de junho de 1948  -  e 24 de Setembro de 1949 a 30 de janeiro de 1951) e José Arnaldo Cabral de Vasconcelos,  que Comandou de 22 de junho de 1948 a 24 de setembro de 1949.

  1. Os Comandos de Elias Fernandes

Logo no começo do primeiro período do Comando de Elias Fernandes, como acontece até os dias atuais, ocorreram muitas mudanças nos diversos escalões de Comando na Polícia Militar, e nas Delegacias que eram ocupadas por Oficiais e Praças da ativa ou da reserva. O Comandante acolheu todas as modificações com serenidade.

Elias Fernandes era muito preocupado com a continuidade do processo de capacitação dos recursos humanos da Corporação através da manutenção de curso e concursos.

Nesse sentido foi realizado um Curso de Aperfeiçoamento de Sargentos, contemplando todos os Sargentos que não tinham Curso de Formação. Essa era uma forma de legalizar a situação desses graduados tendo em vista a nova legislação em vigor, decorrente do advento da Lei 192, de 1936, que regulamentou o dispositivo da Constituição de 1935, que tornou as Policias Militares  em força auxiliar do Exército.

Com o mesmo objetivo foram realizados Curso de Formação de Cabos, Curso de Formação de Soldados e um Concurso de Sargento Protético, para atuar junto ao Serviço de Saúde. Foi também realizado um Concurso de Sargento Músico, além de ter sido reativada uma Escola de Radiotelegrafia, que era uma atividade muito valorizada na época.

Ainda relacionado com a capacitação da tropa, o Tenente Coronel José Gadelha de Melo foi encaminhado à PM do Rio de Janeiro, onde frequentou o Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais. Esse foi o primeiro Oficial da Corporação a realizar esse curso fora do Estado.

As Oficinas de confecção de fardamentos e equipamentos da Corporação foram incentivadas e alcançaram expressiva produção. Nessas Oficinas foram matriculadas mulheres como aprendizes de costureiras e homens como aprendizes de sapateiros. Era a participação da PM na formação de mão de obra de pessoas humildes.

Na busca de uma maior interação da Oficialidade foi incentivada a criação do Clube Recreativo dos Oficiais. Infelizmente essa entidade teve pouca duração. Só em 1964, no Comando do Coronel João Gadelha de Oliveira foi criado o atual Clube dos Oficiais.

No aspecto operacional, a atividade de maior vulto desse comando foi a efetivação da segurança durante as Eleições Municipais, ocorridas no dia 12 de outubro de 1947, que foi um pleito muito tumultuado, mas que transcorreu sem registro de maior gravidade.

Outro trabalho operacional muito importante, agora no segundo período de Comando de Elias Fernandes, foi o realizado na segurança das eleições de 1950, que foram ainda mais disputadas que a anterior.  Essa foi a campanha eleitoral mais violenta da história política da Paraíba. Mas uma vez a UDN e o PSD polarizaram as disputas, ambos com aos ânimos muito exaltados.

Durante a Campanha os dois partidos fizeram comícios no mesmo dia em Campina  Grande, o que não era usual, ocasionando um grave conflito entre os partidários, do qual resultaram três mortes e dezenas de feridos, a maioria partidários do PSD. Quatro Oficiais e sete praças da PM foram acusados desses crimes e acabaram presos preventivamente, no começo do Governo seguinte (de José Américo de Almeida, eleito pelo PDS).  O Inquérito foi feito por um Promotor de Justiça.  As prisões, cumpridas em regime de isolamento, duraram 90 dias, mas todos os policiais foram impronunciados meses depois.   Comício em Campina terminou em bala, três mortos e feridos

No dia 22 de junho de 1948 Elias Fernandes foi substituído por José Arnaldo Cabral de Vasconcelos, Major do Exército comissionado no posto de Coronel. No ano seguinte, no dia 24 de setembro, José Arnaldo pediu exoneração, e Elias Fernandes voltou ao Comando aonde permaneceu até o final do Governo, em janeiro de 1951.

  1. O Comando de José Arnaldo Cabral de Vasconcelos

José Arnaldo Cabral de Vasconcelos voltou para o seu terceiro período de Comando na PM da Paraíba, no dia 22 de junho de 1948.

Durante esse período registramos as seguintes realizações:

   - Adoção e aplicação de um plano de instrução que alcançou todos os níveis hierárquicos. O próprio Comandante também ministrava instrução;

- Realização de um Curso de Formação de Sargentos;

- Incentivo à prática de leitura dos Oficiais, com a aquisição de muitos livros de nobres conteúdos para a Biblioteca da Corporação;

- Concursos de Sargentos Artífices, ampliando a capacidade produtiva das Oficinas  de fardamento e equipamentos para a Corporação;

- Aquisição de um Micro-ônibus para atividades operacionais e administrativas;

-  A Companhia de Bombeiros, que estava sediada no Quartel do Comando Geral, no Prédio da Praça Pedro Américo, foi  transferida para o antigo Quartel da Rua Maciel Pinheiro, onde ficou melhor instalada;

  - O Comandante, na qualidade de Presidente do Conselho Deliberativo da Caixa Beneficente, instituiu procedimentos destinados a aquisição de terrenos e casas na cidade de João Pessoa, para vendas a prazo aos associados;

   - Foi alterado o Regulamento Geral da Corporação, aumentando a idade limite de permanência dos Policiais Militares no serviço ativo que aumentaram em 2 anos para cada posto,  passando, por exemplo, a ser de 60 anos para Coronel, 58  para Tenente Coronel e 56 para Major. Essa medida beneficiava, preventivamente, alguns Oficiais Superiores.

-  Foi contratada uma Companhia de Cinemas para exibição de filmes no Quartel, nos sábados e domingos, para os Policiais militares e seus familiares.

- Foram baixadas normas rigorosas para o comportamento dos Policiais Militares durante o período eleitoral.

Mas os fatos mais marcantes desse Comando foram os que motivaram o seu pedido de exoneração, que podem se  expressos, sinteticamente, da seguinte forma:

  1.  O retorno da democracia trouxe  de volta velhos costumes da república velha, em particular a prática da política patrimonialista onde os dirigentes  costumavam misturar os interesses público com os privados. Uma das formas mais usuais dessas  práticas era o emprego de servidores públicos  em atividades privadas em proveitos de políticos. Com essa finalidade,  desde o início do Comando de Arnaldo Cabral, muitos políticos do interior, aliados do Governador, fizeram pedido  relativos aos Destacamentos, muitos dos quais não eram atendidos por contrariar a orientação do Comando, uma vez caracterizavam  desvio de função. Com isso o Comandante teve conflitos com Políticos e com o Governo.
  2. No início do mês julho de 1949 um grupo de Oficiais redigiu um documento endereçado ao Deputado João Lélis, que era do PSD, partido contrário ao Governo, no qual solicitava daquele parlamentar a intermediação com o Governador para concessão de um aumento para a Polícia Militar. O Comandante teve conhecimento prévio desse documento e apoiou a iniciativa. Esse documento foi publicado no Diário do Legislativo, o que ganho ampla repercussão negativa para o Governo.
  3. Insatisfeito com esse procedimento, o Governador encaminhou um Ofício com termos severos, cobrado explicação do Comandante, que respondeu também no mesmo tom, e pediu exoneração.
  4. José Arnaldo ficou no aguardo de sua exoneração, o que não ocorreu. Prepostos do Governo intercederam junto ao Comandante para convencê-lo a retirar o pedido de exoneração, no que foram atendidos.
  5. No mês de agosto de 1949 ocorreu um duplo homicídio de grande repercussão na cidade de Mamangape, na região do brejo paraibano, e o Tenente Sebastião Salustiano Serpa, Delegado da cidade, foi acusado, juntamente com todo Destacamento. O Secretário de Segurança designou um Delegado Civil para apurar os fatos. No segundo dia de apuração o Delegado entendeu que o Tenente era o autor do crime e solicitou que o Secretário determinasse a sua prisão administrativa, no que foi atendido, através de uma ordem do Governador ao Comandante da PM.
  6. Mesmo tendo de cumprir a ordem do Governador, o Comandante entendeu que no caso não cabia prisão e que se deveria aguardar determinação judicial. Por essa razão foi determinado pelo Comandante que o Tenente cumprisse a punição em sua residência.
  7. O Governo se irritou com essa posição do Comandante e depois de muitas contatos e reuniões com a cúpula da Segurança Pública do Estado, foi determinada a prisão do Tenente no Quartel.
  8. Diante dessa determinação, o Comandante resolveu que o Tenente cumprisse a punição em sala do Estado Maior, como era regulamentar. Na manhã seguinte constatou-se que o Tenente tinha fugido.
  9. Todo escalão do Governo e sua bancada na Assembleia, assim como a Impressa Oficial se posicionaram contra o Comandante.
  10. Diante desses fotos o  José Amando Cabral de Vasconcelos, fez publicar no Boletim uma nota em que expressa a sua insatisfação com o Governo e comunicar o seu pedido de exoneração.

Essa nota, publicada no dia 24 de setembro de 1949, tem o seguinte teor:

Passagem de Comando – De há muito venho sentindo o incômodo que causa ao Governo a minha permanência no Comando da Polícia Militar, isto pelo empenho com que tenho defendido esta Corporação da intromissão indébita nas cousas da Polícia Militar e ainda mais pela resistência feita por mim a pedidos nominais de Soldados e Sargentos indicados por políticos do interior para utilizá-los certamente em função que não a policial. Este incômodo culminou por causa de cousas políticas,  quando os Oficiais dirigiram um memorial ao Dr. João Lélis pedindo-lhe  o apoio ao projeto de aumento de vencimentos.  Por essa ocasião recebi um ofício enérgico do Exmo. Governador, respondi-lhe no mesmo diapasão e pedi a minha exoneração. Não lhe convinha a exoneração naquela época porque acarretaria as antipatias para si.  Mandou-me implorar por emissários que retirasse o pedido. Ficou na tocaia até que a oportunidade apareceu: a celeuma creada com a fuga do Tenente Serpa. Aproveitou-se da opinião pública mal informada e o leader do partido Governamental na sessão doa dia 22 apontou o caminho que deveria seguir o Comando da Polícia Militar. Esperei até hoje que o Governo retificasse o referido discurso, não o fez, portanto, se não insinuou, aprovou.

Em face do exposto deixo o Comando da Polícia Militar, passando-o ao meu substituto legal, o Tenente Coronel Elias Fernandes, com a consciência tranquila, certo de que fui sacrificado devido ao interesse em favor desta gloriosa corporação e dos caros camaradas. Aos Oficiais, Subtenentes, Sargentos, Cabos e Soldados minhas despedidas e agradecimentos pela leal cooperação.

Assinado – José Arnaldo Cabral de Vasconcelos – Comandante Geral

                                                      24/09/1949

 

Saliente-se que o Tenente Salustiano Serpa, por conta desses fatos, foi excluído por deserção,  e meses depois foi julgado, absorvido e reincluído, com todos os seus direitos, inclusive os vencimentos retroativos

Ressalte-se, por oportuno, que o Tenente Sebastião Salustiano Serpa, era irmão de Jacinto da Costa Serpa, que bem depois desses fatos ingressou na PM, chegou a Coronel e foi Subcomandante Geral no final da década de 1980.

  Os Comandantes da PM da Paraíba de 1912 a 1931   A Galeria dos ex-comandantes da PM da Paraíba    

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