O poema Tranca Rua e o Soldado de Polícia na concepção de Amazan

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         Tranca Rua é o personagem criado pelo poeta Amazan para caracterizar a ação de um homem valente, que quando embriagado pratica desordem e enfrenta a polícia em pequenas cidades do interior. Essa figura é retratada no Poema Tranca Rua no qual também é registrada, de forma caricaturada e engraçada, como o poeta, expressando aspectos do consciente coletivo interiorano, ver o papel de um Soldado de polícia. Aqui Vamos fazer um pequeno relato dessa obra do poeta no contexto da realidade de um Destacamento policial no interior da Paraíba até o final da década de 1960

Durante o meu Comando no segundo Batalhão (1996/97), recebi muitas visitas importantes no Gabinete daquele Quartel. Parlamentares, Secretários, Juízes, Promotores, empresários, Dirigentes de serviços públicos, professores, jornalistas, intelectuais, líderes comunitários, artistas, enfim, representantes de todas as classes sociais. Sei que tais deferências não eram para mim como pessoa física e sim à autoridade que eu representava, razão pela qual eu via essas honrarias com naturalidade. Essa atenção deve ter sido dada a todos os que exerceram, exercem ou exercerão aquela importante função.

Todas essas ilustres visitas foram muito importantes, para mim e para o Batalhão, mas ainda hoje guardo na memória duas delas. Uma foi a do grande Adilson Maguila, com quem conversei longamente naquela oportunidade. A outra foi a do poeta Amazan, com quem tive oportunidade de diversos outros contatos.

Já conhecia parte dos trabalhos de Amazan, mas a partir de então me tornei seu fã, não só do forrozeiro, como ele é mais conhecido, mas em particular pelas suas poesias, tidas como matutas, que são criativas, irreverentes e muito engraçadas. Pelo menos em dois desses trabalhos: “O filho da Excelência” e “Tranca Rua”, são abordados temas do cotidiano da vida policial militar reveladores de situações não muito diferentes da atual realidade.   Nesses textos constatamos como o poeta, de maneira figurada, consegue captar a forma como o consciente coletivo da comunidade interiorana percebe o policial militar e o seu papel na sociedade. É sobre este aspecto que pretendo comentar. Aqui vamos nos reportar ao mais famoso desses poemas, que tem o título de TRANCA RUA. (Transcrito no final)

Não vamos nos deter a apreciações literárias por não ser essa a nossa praia. Nesse aspecto, como leigo, queremos apenas registrar a nossa admiração pela forma, conteúdo e, sobretudo pelo desfecho do trabalho. Enquanto policial o que chama a nossa atenção nesses versos de Amazan é a constatação da existência de alguns detalhes interessantes relacionados com a atividade policial militar.

Primeiramente observamos a forma como o poeta retrata o papel do destacamento policial militar em uma pequena cidade do interior, onde representa a única forma de defesa da sociedade. São aos Soldados desses Destacamentos que as comunidades recorrem quando se sentem diante dos perigos causados pelas ações dos tranca ruas. Mesmo que nesses confrontos eles fiquem “istrupiados” como diz os versos.

Outro detalhe curioso é a importância que o personagem Caboré dá ao fato de ter passado no concurso para ingressar na polícia, o que atualmente é comum em qualquer cidade interiorana e não só na de Tranca Rua. (... “mim alistei num concurso militar e num é que eu passei” )

O tipo físico ideal do policial revelado pelo poeta é feito através do contraste da figura caricaturada de Caboré, ou seja, um tipo totalmente inadequado à função policial. (”... Um cabra mufino, desses do pescoço fino, cabeça achatada e feia”.)

Caboré é caricaturado como um Soldado disciplinado que mesmo com medo cumpria as ordens que recebia do seu chefe, o que revela, de certa forma, a realidade de todo policial. (...”Porém se o chefe mandasse, prender alguém quem errasse, dava a gota mais eu ia.”)

O Destacamento de Caboré era comandado por um Tenente que também era o Delegado, o que revela a existência de uma polícia de ciclo completo, o que era comum até o final da década de 1970.  

Quando Caboré foi intimar Tranca Rua, astuciosamente foi sem farda e no caminho foi bolando uma história cobertura ( ...Aqui acolá parava, fazia um gesto “insaiava” o que diria para ele..”), e ao perceber o perigo que era enfrentar a resistência de Tranca Rua, ele inventou que era caçador para se aproximar do “fariseu”.

Tudo ia dando certo, até que a vaidade de querer aparecer como valente, o tolo exibicionismo, infelizmente ainda comum em alguns policiais, e por vezes incentivado por superiores, acabou levando Caboré à desastrosa situação expressa no final do poema. (...Nisso eu fui e passei pra trás, e pra chamar a atenção, e só pra mim mostrar, eu resolvi “impurrar” Tranca Rua com a mão..”

           O resultado foi uma pisa grande que todo Destacamento levou.

Eu só sei qui o delegado

Até hoje é aleijado

E qui esse uvido meu

Nunca mais iscutou nada

Adispois da bordoada

Qui Tranca rua me deu.!

Registro, por fim, a descrição que Amazan faz de Tranca Rua e a sua coincidência com o tipo físico Maguila, a outra ilustre visita.

Tranca rua era um caboco

De dois metros de artura

Os braço era aqueles tôco

As pernas dessa grossura

Assim, entendemos que esse trabalho de Amazan é uma excelente forma de homenagear os policiais militares. Proponho até que o Comando da Corporação faça uma justa retribuição a esse grande artista, mesmo que já tardia.

Na página 2 transcrevemos  na íntegra  esse fabuloso poema de Amazan.

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