A bomba de Cajazeiras

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A bomba de Cajazeiras foi a forma como ficou conhecido um trágico acontecimento registrado naquela cidade em 1975. Aqui vamos fazer uma síntese desse grave episódio como forma de reconhecer e enaltecer a figura de um Soldado que no cumprimento do dever foi uma das vítimas fatais daquele fato.  É o que passamos a fazer

  1. Introdução

Em 1975 a cidade de Cajazeiras foi palco de um crimes de muita repercussão e que provocou um clima de insegurança na população.  Foi um atentado a bomba, dentro de um cinema da cidade e que teria, em tese, a finalidade de assassinar o Bispo Zacarias Rolim.

Sobre esse fato, cuja autoria e motivação nunca foram descobertos, muitas pesquisas já foram feitas por pessoas capacitadas do mundo intelectual daquela progressista cidade. Dada a especificidade do momento político em que se vivia, a apuração e possível julgamento do fato transcorreu em absoluto sigilo, o que instigou as pesquisas que buscavam a verdade, mas gerou frustrações nos pesquisadores ao se constatar a impossibilidade de acesso aos documentos que pudessem   elucidar os fatos.

Aqui ao tratar dessa questão não estamos voltados a entrar no mérito da apuração, julgamento e na constatada impunidade do caso. Não temos elementos novos para esse fim.

Buscamos apenas expor uma síntese dos fatos e ressaltar a participação do Soldado Altino Saturnino da Silva, conhecido por Didi, que foi uma das vítimas daquela nefasta ação, quando no cumprimento do dever, e que, portanto, merece o reconhecimento da Corporação e da sociedade.

  1. Síntese do fato

O filme começou na 8 da noite no Cine Apolo XI, em Cajazeiras, naquela quarta-feira, 2 de julho de 1975. Pouca gente foi assistir “Sublime Renúncia”, filme lançada em 1971, e que era proibido para menores de 18 anos, um tipo de censura bastante comum naquela época. O Cinema pertencia à Diocese daquela cidade, que tinha como Bispo Dom Zacarias Rolim.

Na primeira fileira de cadeiras tinha uma que era reservada exclusivamente para Dom Zacarias, um aficionado por cinema e que definia os filmes que ali seriam exibidos e sempre comparecia às sessões.

Mas, naquela noite, o Bispo estava em Recife locando novos filmes. Essa informação não era do conhecimento da população daquela cidade.

Durante a exibição da película, as fitas se quebraram várias vezes, e a pessoa que operava o projetor teve dificuldades para fazer as emendas, sendo necessário retirar muitos pedaços de fita de cada rolo. Dessa forma a duração do filme foi encurtada em uns 10 minutos.

Próximo das dez horas a sessão acabou e os assistentes começaram a se retirar, com alguns deles fazendo comentários sobre o enredo do filme.

Pouco depois, só restaram na sala o Soldado Altino Saturnino da Silva, conhecido por Didi, que toda noite fazia a segurança do local, e mais três civis:  Geraldo Galvão que era um adolescente, e os irmãos Manuel Justino Conrado e Geraldo Justino Conrado.

Teve início uma breve conversa entre eles. De repente Manuel Justino Conrado, percebeu um objeto verde debaixo da cadeira reservada para o Bispo, e, por curiosidade, foi lá busca-lo e o entregou a Didi.  Era uma valise do modelo conhecido por Pasta 007.

No momento em que Didi pegou na Pasta, deu-se a tragédia.  Ela explodiu, fazendo um grande estrondo, o que assustou a população da cidade. Os amigos tentaram correr, mas não deu tempo. Os quatro ficaram feridos. Os mais atingidos foram Didi e Manuel Conrado que foram atingidos nas pernas. Os ferimentos dos outros dois, foram menos graves.

Todos foram levados para o Hospital local.  O fato teve repercussão nacional.

O que aqui descrevemos sobre a discrição dos fatos é uma síntese do que foi publicado no Jornal Correio da Paraíba na época desses acontecimentos.

O pesquisador e prestigiado escritor Cajazeirense, Francisco Cartaxo, que desenvolveu uma profunda pesquisa sobre esse fato e teve acesso a fragmentos do Inquérito, descreve que o momento de tragédia teria ocorrido da seguinte forma:

“A bomba foi encontrada após o encerramento da sessão pelo soldado Didi, que junto com outros auxiliares, faziam a arrumação da sala. Em uma das cadeiras, ele se deparou com a pasta e dentro dela, um objeto retangular, que ele acreditava ser um gravador. Ao pegar nesse objeto, Didi foi surpreendido por um grito de Manuel Conrado, alertando que ele estava com uma bomba nas mãos. Assustado, o Soldado deixou o objeto cair. Isso foi suficiente para que o artefato explodisse, ferindo a ele e outras três pessoas.”

Como se verifica essa discrição dada pelo ilustre Pesquisador Francisco Cartaxo, que merece todo o nosso crédito,  difere da versão publicada na Imprensa, mas, na essência, não muda o desenrolar dos fatos.

Dada a gravidade dos ferimentos, Didi teve as pernas amputadas no Hospital de Cajazeiras. No dia 7 de julho Manuel Conrado foi transferido para o Hospital São Vicente de Paula, em João Pessoa, onde no mesmo dia foi a óbito. No dia seguinte (08/07) o Soldado Didi foi transferido para o Hospital Edson Ramalho, onde faleceu dois dias depois (10/07).

Em consequência, no dia 16 de julho o Soldado Altino Saturnino da Silva foi excluído do efetivo da Polícia Militar e no dia 23 do mês foi promovido post-mortem, à graduação de Cabo, por ato de bravura. O Soldado Didi era filho de Saturnino Conceição da Silva e Maria da Conceição, e nasceu no dia 3 de maio de 1931, no Rio Grande do Norte. Portanto, por ocasião do fato ele tinha 44 anos de idade.

  1. A apuração

Pouco depois da explosão, o Sargento do Exército Kleber Gonzaga que estava em Cajazeiras a passeio, chegou ao Cinema poucos minutos após a explosão, fez um breve levantamento do fato e comunicou ao Comandante do Grupamento de Engenharia, que acionou a Polícia Federal.  Essa informação consta em matéria publicada pelo Jornal Correio de Paraíba, na semana do fato.

O Dr. Sadoc Reis, Superintendente da Polícia Federal na Paraíba, deslocou-se para Cajazeiras e entendendo que o fato configurava um atentado terrorista, assumiu o comando da apuração.

Com isso a Polícia Civil ficou fora do caso. Mas o Capitão Romualdo de Carvalho Costa, que tinha assumido a Delegacia daquela cidade no dia 10 de junho daquele ano, já havia efetuado as primeiras diligências e providenciado o isolamento do local, tendo para esse fim, solicitado reforço ao Batalhão de Patos.

Quando o Soldado Didi faleceu, o Dr. Sadoc evocou a Lei de Segurança Nacional e determinou que o Inquérito tramitaria no mais absoluto segredo.  A partir de então os jornais do Estado não publicaram mas nada sobre esse fato, nem da fase de investigações e nem da instrução criminal, se existiu.

Como o julgamento do fato era da competência da Justiça Federal, o Fórum de Cajazeiras nunca foi acionado.

  1. As consequências

Muitas pesquisas foram feitas sobre esse caso, mas nunca se obteve dados concretos que pudessem indicar se o alvo do atentado realmente foi Dom Zacarias, e quem teria sido os mandantes e os executores.

Levantou-se a tese de que a bomba estava programada para explodir antes do filme terminar, mas como houve um encurtamento do tempo de projeção, em razão dos cortes das fitas, a explosão ocorreu pouco depois do fim da sessão, como relatado. Portanto, se a sessão tivesse tido a duração normal, a quantidade de vítimas teria sido bem maior.

Conta-se também que uma pessoa, em uma confissão a Dom Zacaria, teria assumido a autoria do crime, mas, por razões dos deveres de sacerdote, aquele religioso nunca falou sobre o fato.

Em 1992 Dom Zacarias faleceu, e os autores desse delito nunca foram identificado e punidos.   Um crime de elevada gravidade ficou impune, como vários outros da mesma natureza.

  1. Clima de insegurança na cidade

A gravidade desses fatos originou um clima de insegurança na cidade e a sociedade cajazeirense, através dos seus representantes, começou a reivindicar providencias das autoridades. Em nota publicada no Jornal Correio da Paraíba o Juiz da Comarca Ruy Formiga criticou a exoneração do Delegado Coronel Ivanile Lordão, que foi substituído pelo Capitão Romualdo de Carvalho Costa. Alegava o Magistrado que o Delegado substituído era bem mais experiente, tinha um bom relacionamento com as autoridades locais e mantinha a ordem pública na cidade.

No dia 16 de junho foi noticiado no mesmo jornal que o povo de Cajazeiras estava reivindicando a transferência do Batalhão da Patos para aquela cidade. Registre-se que naquela época estava sendo construído um Quartel em Cajazeiras para sediar uma Companhia de Polícia que já tinha sido criada, mas ainda não estava instalada. O policiamento da cidade era feito por um Destacamento composto por cerca de 20 homens. Registre-se também que o Batalhão de Patos tinha sido instalado em 1972.

Dessa forma, fica consignado que o Soldado Altino Saturnino da Silva, conhecido por Didi, foi vítima fatal de uma tragédia quando estava no cumprimento do dever funcional, o que lhe faz merecedor das honras de um herói, o que precisa ser reconhecido de forma objetiva pela Polícia Militar e pela sociedade de Cajazeiras.

(Na efetivação dessa pesquisa contamos com a colaboração do Pesquisador Damião Moreira, residente em Cajazeiras)   Veja também  - A indústria da seca Publicação do Pesquisador Francisco Cartaxo https://auniao.pb.gov.br/noticias/caderno_diversidade/o-atentado-que-abalou-o-sertao-paraibano

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