Da farda à toga

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      Da farda à toga foi o caminho percorrido por vários integrantes da Polícia Militar da Paraíba, que deixaram a Corporação por ter ingressado na Magistratura, todos mediante Concurso Público. Entre esses valorosos policiais Militares podemos citar: O Capitão Rui Eloy, da turma do Curso de Formação de Oficiais de 1958, que ingressou na Magistratura da Justiça do Trabalho, galgando a posição de Desembargador

O também Capitão Lavoisier Nunes de Castro, da mesma turma de Rui Eloy, que se tornou Juiz de Direito no Estado do Rio Grande do Norte.  O Capitão Manuel Paulino da Luz, do CFO de 1967, que foi Juiz e Desembargador na Paraíba.

     O Tenente Coronel Ambrósio Agrícola Nunes, da mesma turma de Manuel Paulino, que foi Promotor Público na Paraíba e Juiz de Direito em Pernambuco.  O Capitão José Antônio Alves de Souza que foi Promotor Público na Paraíba e depois  Juiz em Pernambuco.

       Outros integrantes dessa Corporação ingressaram no Ministério Público a exemplo do Sargento José Paulino e dos Capitães José de Souza Neves, Gerson Barbosa,  Jose Farias de Souza, Aluízio Bezerra Cavalcanti,  Henrique Cândido e o Capitão Gerson Barbosa de Souza, este no Rio Grande do Norte e os demais na Paraíba.  Os Capitães Rivaldo da Silva e José Cláudio da Costa ingressaram no Quadro de Delegado da Polícia Federal.

     A Polícia Civil da Paraíba também recebeu Policiais Militares em seu Quadro de Delegado onde ingressaram ao longo dos anos 1980 e 1990: O Subtenente Severino Paiva, os Sargentos Jordão Moreira, Paulo Josafá de Araújo, Ivaldo Pedro Dias, Pedro Benjamim, João Vicente, Severino Sena, Francisco Araújo,   e o Soldado Carlos Alberto, entre outros.

       Os Sargentos Martinho Moreira e Luiz Agripino  Ramos também passaram pelo Quadro de Delegados da Polícia Civil da Paraíba e depois ingressaram no Ministério Público

       Os Quadros de servidores e professores da Universidade Federal da Paraíba, nas décadas de 1970 e 1980, receberam os seguinte integrantes da Polícia Militar: Os Capitães Francisco Martins da Silva, Raimundo Notado e Severino Oliveira, todos como professores e o Tenente Josafá Alves de Lima, como Contador. O Capitão Flávio de Oliveira Silva, que entre outras funções, foi Diretor do Colégio da Polícia Militar, deixou a corporação, em 2005, para ingressar como professor de Filosofia na Universidade Estadual da Bahia.

            Vê-se, pois, que a Polícia Militar da Paraíba tem sido um permanente celeiro de valore para outras instituições Mas, neste trabalho vamos focar a nossa atenção para o primeiro Policial Militar da Paraíba a ingressar na Magistratura e se tornar Desembargador. É o que passamos a fazer.

1. O Capitão Manuel João da Silva

          O humilde casal José Severino da Silva e Amália Augusta da Silva era comerciante nas feiras livres da cidade de Carpina, Pernambuco, e cidades vizinhas. Em 1925 eles fizeram uma viagem daquela cidade para Recife, em um desses Caminhões que transportavam cargas e pessoas, e eram conhecidos por Caminhão Misto. Na estrada esse veículo capotou e o casal faleceu no local. O único filho do casal era Manuel João da Silva, nascido em 24 de novembro de 1913, portanto com 12 anos de idade na época desse fato, e que ficou desamparado.

         Poucos dias depois dessa tragédia, uma pessoa amiga da família transportou o garoto para a Capital da Paraíba, onde o entregou aos cuidados do Padre José Coutinho, que desenvolvia atividades filantrópicas nessa cidade e gozava de muito prestígio no meio político do Estado.

         Manuel permaneceu sob os cuidados desse religioso até alcançar a maioridade quando, no dia 7 de 1932 ingressou como Soldado na Brigada Policial, denominação da Polícia Militar na época. Como tinha baixa escolaridade, Manuel João foi compulsoriamente matriculado na Escola Regimental da Corporação, que era um curso de alfabetização e de ensino equivalente ao curso primário da época.  Essa Escola foi criada em 1912 e existiu até meados da década de 1940. O Curso de Soldado tinha duração longa em razão do constante emprego dos recrutas em atividades operacionais, em particular no interior.

      Em junho de 1932 a Brigado Policial começou a mobilizar efetivo para enviar para São Paulo onde, ao lado das Tropas Federais, combateu o movimento revolucionário ocorrido naquele Estado.  Por esse motivo a turma de Recrutas de Manoel João foi encerrada e todos ficaram definitivamente prontos para o serviço. Nessas condições Manuel João passou a prestar serviço nas atividades internas no Quartel e em abril de 1933 foi transferido para o Destacamento de Guarabira.

     Naquele ano Manuel João participou de uma formatura em homenagem ao Presidente Getúlio Vargas, que esteve em visita à Paraíba. Pela forma como se portou nesse evento, Manuel João foi elogiado pelo Comandante.  Em fevereiro de 1934 Manuel João voltou à Capital, vindo de Guarabira, e se matriculou na Escola Regimental, agora como voluntário, e em setembro do mesmo ano, foi aprovado no Concurso para Terceiro Sargento.

      Dessa forma, no mesmo mês, foi promovido primeiramente a Cabo (4 de setembro) e cinco dias depois foi Terceiro Sargento (9 de setembro).  Nessa graduação ele passou a exercer as funções de Furriel, uma espécie de Tesoureiro e responsável pela logística de uma fração da tropa, o que revela ser portador da confiança do Comando. No dia 15 janeiro de 1935 foi ele promovido a Segundo Sargento e no dia seguinte alcançou a graduação de Primeiro Sargento.

      Essa era uma situação prevista na legislação na qual se definia que as promoções eram feitas gradualmente, ou seja, graduação a graduação. No decorrer desse ano e dos três anos seguintes Manuel João foi Sargenteante, o graduado que controla o efetivo de uma Companhia. Foi ainda Sargento Brigada do Batalhão, uma espécie de Chefe dos Sargenteantes e dos graduados que cuidavam da logística.  O exercício dessas atividades é próprio dos graduados dotados de capacidade técnica, espírito de liderança e comprometimento com a função.

       Paralelo à essas atividades, Manuel João frequentava o Curso Ginasial no Colégio Tomaz Mindelo, localizado nas proximidades do Quartel, e depois o Curso Clássico, (Atualmente equivalente ao Ensino médio) no Colégio Liceu Paraibano, na época já funcionando no seu prédio atual.  Durante o Comando do Coronel Delmiro Pereira de Andrade, Oficial do Exército, (1935 a 1938) foi iniciado um levantamento de dados sobre a história da Corporação, e o Sargento Manuel João foi um dos encarregados dessa tarefa, o que foi feito na forma determinada, sendo por esse motivo elogiado pelo Comando.   Depois desse levantamento a Corporação passou a comemorar a data da sua criação, que por muitos anos foi considerada como sendo o dia 10 de outubro de 1831.

        Só em 1975 essa data foi mudada, para 3 de fevereiro de 1832, depois de uma profunda pesquisa realizada pelo Padre Eurivaldo Caldas Tavares, Capitão Capelão da Polícia Militar. Promovido a Subtenente em 14 de agosto de 1938, Manuel João foi transferido para o Segundo Batalhão, que tinha sido transferido poucos dias antes de Patos para Campina Grande   .No início de março de 1939 o Subtenente Manuel João se submeteu ao Concurso de Segundo Tenente do Quadro da Administração, sendo aprovado e promovido a esse posto no dia 7 do mesmo mês.

       Com o mesmo entusiasmo, dedicação e competência como se portava como praça, o Tenente Manuel João passou a ocupar as funções pertinentes aos Oficiais subalternos (Segundo e Primeiro Tenente).    Assim ele dirigiu o Serviço de Intendências, setor da corporação que produzia fardamentos e equipamento; foi Tesoureiro, Secretário do Primeiro Batalhão e Almoxarife. Pela qualidade dos serviços que prestou nessas funções foi elogiado pelo seu Chefe imediato, o Capitão João Rique Primo, um dois mais conceituados Oficias da época por sua capacidade técnica.

     Essas qualidades foram reconhecidas e elogiadas pelo Coronel Elísio Sobreira, que, em 1949, no início do Governo de Rui Carneiro, voltou ao Comando da Corporação depois de dois anos a inatividade.   No mesmo ano, o Coronel Solon Ribeiro, Oficial do Exército, que substituiu Elísio Sobreira no Comando, também consignou Elogios ao competente Tenente Manuel João, pelos mesmos motivos.   Em 1935 a Lei Federal 192 definiu regras para o funcionamento das Polícias Militares, tornando obrigatório, entre outras coisas, os Cursos de Formação e de Aperfeiçoamento de Praças e de Oficiais, o que seria exigido a partir de 1941.

         Dessa forma, a Polícia Militar da Paraíba, a partir de 1936, começou a se adaptar a essa nova legislação, dando prioridade ao que se relacionava com a situação dos Praças e em 1941 foi realizado um Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais, (CAO) para o qual foram selecionados 14 Oficiais, e entre eles estava o Segundo Tenente Manuel João da Silva.  O Curso foi concluído no dia 12 de novembro de 1941 e Manoel João foi o segundo colocado, motivo pelo qual foi alvo de um elogio do Comandante, o Coronel Anacleto Tavares (Oficial do Exército).

        A essa altura ele já tinha concluído o Curso Clássico no Colégio Liceu Paraibano e em 1945 concluiu o Curso de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, na Faculdade de Direito de Recife. Entre os seus colegas de turma da Faculdade estavam Ivan Bichara Sobreira, que depois foi Governador da Paraíba e Arquimedes Souto Maior, que também foi um ilustre Magistrado no Estado   .Depois do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais, Manuel João deu continuidade à sua carreira militar, sendo promovido a Primeiro Tenente no dia 28 de dezembro de 1941 e a Capitão em Janeiro de 1946.

      Nos Postos de Primeiro Tenente e de Capitão Manuel João exerceu entre outras as seguintes funções: Comandante de Companhia, Instrutor dos Cursos de Formação de Sargento, e do Curso de Formação de Oficial, Ajudante Geral da Corporação, Comandante do Primeiro Batalhão, Integrante do Conselho Permanente de Justiça na Auditoria da Justiça Militar, o que ocorreu durante quatro trimestres intercalados, integrantes de Comissões de Exames dos Concursos aos Cursos de Formação de Sargento, Delegado de Polícia em Campina Grande e Caiçara.

       Na caderneta de assentamentos do Capitão Manuel João da Silva consta um total de 16 elogios, dois deles emitidos pelo Governador, o que comprova as suas qualidades como exemplar policial e como cidadão.  Aprovado em Concurso Público, o Capitão Manuel João da Silva foi nomeado Juiz de Direito da Comarca de Conceição no dia 11 de novembro de 1951.

2. O Magistrado Manuel João da Silva

  .O Doutor Manuel João da Silva foi Juiz nas Comarcas de Conceição, Itaporanga, Pedra de Fogo, Alagoa Grande, Campina Grande e João Pessoa, onde por longos anos foi titular de Varas Civis. Como Desembargador ele integrou as Câmaras civis do Tribunal de Justiça. Manuel João foi casado com Dona Maria de Lurdes Serejo, em 1944.

        O casal teve dois filhos, Amália Serejo e Henrique Serejo, que depois de servir como funcionário do Tribunal de Justiça, ingressou no Ministério Público aonde chegou ao cargo de Desembargador. Quando Henrique Serejo, afilhado do Coronel Manuel Câmara, Oficial da PM, estudava em uma escola primária, nas proximidades da Rua das Trincheiras, e seu pai já era juiz, por vezes recebia uma carona em uma Jipola que transportava os Oficiais da PM.

         Em uma dessas ocasiões o Coronel José Maurício da Silva, renomado Oficial da Corporação na época, e conhecido autodidata detentor de uma ampla cultura geral, estava no veículo e fez perguntas sobre os temas ministrados na escolar ao garoto Henrique Serejo, o que foi respondido com acerto. Diante da desenvoltura do menino, Zé Maurício disse em tom de brincadeira com os seus companheiros. “Esse menino vai ser Major”, uma alusão de que ele superaria o seu pai, que foi Capitão.

        Esse fato gerou o apelido de Major ao jovem Serejo, o que o acompanhou o resto da vida.  Ainda hoje ele é conhecido por Major, o que muito lhe envaidece. Mesmo na Magistratura, o Doutor Manuel João mantinha estreita ligação com a oficialidade da PM. Ele morava na Rua João Machado onde recebia à noite para longos bate-papos os Oficiais Manoel Noronha Cesar, de quem era compadre e que residia na Rua B. Ronha, e Clodoaldo Passos Fialho e Ozório Olímpio de Queiroga, que moravam na Rua Coremas.  Era comum muitos outros Oficias participarem desses encontros, conforme lembra o Dr. Henrique Serejo, o Major, que na época era criança e acompanhava a tudo com muita curiosidade.

      Quando o Doutor Manuel João foi Juiz em Pedras de Fogo criou um Colégio profissionalizante que recebeu o nome de Colégio João Úrsulo Ribeiro e que depois foi estadualizado e ainda hoje existe atendendo muitos jovens da região. Paralelo às suas atividades como Juiz em João Pessoa, o Doutor Manuel João era Professor de Educação Moral e Cívica no Liceu e de Direito Penal na Universidade Autônoma, como era conhecida o atual Centro Universitário de João Pessoa. O Juiz Manuel João era um homem disciplinado, disciplinador e muito austero.

       Quando era Juiz no interior, muitas vezes ele recebia presentes de Advogados nos fins ano, o que era comum na cultura local, mas mandava seu filho Henrique Serejo devolver.  A ligação do Doutor Manuel João com a Polícia Militar era tão forte, que no tempo em que ele foi juiz de Campina Grande, morava no Quartel do Segundo Batalhão. Em 1980, no dia 1 de novembro, o Desembargador Manuel João da Silva, faleceu, aos 66 anos de idade, quando estava em tramitação o seu processo de aposentadoria.

  Veja também   PM da Paraíba: Celeiro de valores para outras instituições.   Manuel Paulino da Luz, o Magistrado forjado na disciplina militar

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