Um ato humanitário em meio à violência

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      Um ato humanitário praticado por um Sargento Comandante de uma Guarnição de Rádio Patrulha, durante uma fria madrugada e depois do atendimento de diversas ocorrências em que a vida da guarnição foi posta em risco, chamou a atenção dos policiais que integravam a guarnição e aos superiores hierárquico do velho Sargento.
      É esse fato que passamos a narrar como forma de preserva um exemplo de humanismo nas ações policiais.
     Depois do atendimento da quinta ocorrência naquela madrugada chuvosa de junho de 1979, a Guarnição do Sargento Freire estava exausta. Foram dois assaltos, uma condução de débil mental, uma lesão corporal e o transporte de uma parturiente. Atendendo a um pedido do Motorista, o Soldado Nóbrega, mas conhecido por Gigante, dado o seu porte físico, Freire resolveu descansar um pouco no Posto de Policiamento Integrado, que funcionava no prédio que atualmente abriga a terceira Delegacia da Polícia Civil, na Epitácio Pessoa. O local servia de apoio e coordenação do Policiamento Ostensivo da área compreendida entre o centro da cidade e a praia.
A Guarnição não teve tempo nem para desembarcar, quando foi acionada para mais uma ocorrência. A Central de Comunicações da PM funcionava em uma pequena sala no segundo andar do Primeiro Batalhão. O operador da Central era o Sargento Felix, mais conhecido por Coringa, talvez uma alusão à sua habitual prática do jogo de baralho. Com uma voz meio metálica, já muito conhecida por todos policiais, CorinLinks Quebradosga deu a ordem: “Viatura 009 desloque-se ao Elite Bar, no final de Rui Carneiro. O solicitante está aguardando no local em um Chevette dourado”
Já passava das cinco horas. A Guarnição se preparou para enfrentar mais uma situação em que uma pessoa, ou um grupo se recusava a efetuar o pagamento de despesas, o que era muito comum àquela hora. E o pior, aquele local era muito frequentado por “sabe com quem está falando”, o que exigia mais cautela da Polícia. É bem aquele cara da semana passada, comentou Jacinto, o outro Soldado da Guarnição.
A Viatura estacionou por trás do tal Chevette e, por precaução, Freire anotou a Placa do veículo. Era de Campina Grande. Um carro do ano. Um homem de aproximadamente quarenta anos, alto, magro, de bigode, roupas finas, e em aparente estado de embriagues, estava ao lado do carro.   A porta traseira, do lado do motorista estava aberta. O magrão estava desesperado apontando para o interior do veículo. De imediato Freire pensou que estivesse diante de um caso de homicídio ou coisa do gênero.
A Guarnição de aproximou com cuidado e cercou o Chevette. Soprava uma brisa muito fria. Chorando o homem se dirigiu a Freire. “Eu estava aí no Bar e quando ia sair encontrei essa criança dentro do carro. Acho que deixei a porta aberta. Sou de Campina e se eu chegar em casa com essa criança minha mulher não vai acreditar nessa história. Me ajude pelo amor de Deus”
Freire se emocionou com a cena. Era uma criança recém-nascida, dormindo envolta numa toalha.  Parecia ter nascido naquela madrugada. Sem nada dizer, Freire pegou a criança no colo e se dirigiu à Viatura. Ele sabia o procedimento policial que deveria ser adotado em uma situação como aquela. Mas o disciplinado e experiente Sargento, levado pela emoção, ordenou ao Motorista “Gigante, vamos para a minha casa. Vou ficar com essa criança”
No caminho Jacinto perguntou se era menino ou menina. Freire deu uma olhada e disse “é menino e vou chamá-lo de Franklin”. Será meu sétimo filho. Nada foi registrado da ocorrência.
Na passagem do serviço o Tenente percebeu algo diferente no comportamento das Guarnições, mas não conseguiu descobrir nada. As outras Guarnições sabiam do fato, mas nada comentavam para evitar complicações para Freire. Franklim foi registrado e criado por Freire e só tomou conhecimento desse fato quando completou dezoito anos.  Atualmente ele é casado e mora no interior de Pernambuco.
Mesmo em meio às agruras do serviço policial, marcado pelo enfrentamento á violência, o velho Sargento teve um gesto humanitário nobre, no que contou com a solidariedade dos seus companheiros.

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