Polícia e política: Dificuldades de adaptação de Oficiais e Praças de vocação técnica

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         Polícia e política são atividades que raramente se conciliam.  Os Oficiais e Praças com vocação técnica  sentem muitas dificuldades para se adaptar às situações em que predomina o viés político. Os mais habilidosos nessa área acabam ocupando funções  de relevo, não raro em desfavor de outros dotados de melhor qualificação técnica para esse fim. Situações como essa acabam provocando desconforto, desmotivação, e infelizmente, inimizades pessoais, o que acarreta prejuízo para a corporação.
      Os cursos de formação e os de aperfeiçoamento de Oficiais da Polícia Militar, em sua essência, são destinados a preparar esses profissionais para o exercício das funções de comando.  Além dos
conhecimentos específicos para esse fim, obtidos em disciplinas próprias como as relacionadas a Direito Administrativo e a Teoria Geral da Administração, esse preparo para comandar perpassa, praticamente, todas outras atividades durante os cursos.
       No exercício das funções próprias dos primeiros postos da carreira, as habilidades de cunho técnico, em particular as voltadas para as atividades operacionais são fortalecidas com as experiências obtidas nas ações que cotidianamente so desenvolvidas pelos oficiais.
      À medida que o Oficial vai alcançando postos mais elevados a habilidade para comandar vai se tornando cada vez mais indispensável. Administrar recursos materiais, financeiros e principalmente humanos, vai se tornando comum na vida do oficial.  O acúmulo de experiências nessas áreas ao longo da carreira facilita o desempenho dessas funções. A formação técnica e doutrinária das Praças, assim como o seu aprendizado no cotidiano segue essa mesa orientação.
      Entretanto, uma condição indispensável para quem comanda, assim como para quem dirige qualquer órgão público, é a habilidade política. É nesse ponto que muitos oficiais encontram dificuldades. Nos cursos policias são discutidos princípios de ciência política, e outras disciplinas correlatas, mas, em um contexto mais amplo, se enfatiza a adoção de valores baseados em princípios técnicos e legais.
     Esse fato faz com que muitos oficiais e praças tenham dificuldades para assimilar a necessidade de adoção de medidas de natureza política no exercício de suas funções.  Oficiais perderem comandos por não se adaptarem às circunstâncias políticas é fato comum uma vez que eles são preparados para serem legalistas, o que lhes dificultam a absorção de valores políticos partidários.  Com as Praças ocorrem problemas da mesa natureza.
   Percebendo que através da política pode se abreviar a ascensão a postos, ou graduações e funções e se obter outros benefícios legais, alguns oficiais e praças buscam esse caminho, o que é plenamente legítimo dentro de um regime democrático. Mas, infelizmente, nem sempre isto é feito de forma ética, o que é um conceito muito discutível em política. Nessas situações o principal alvo é a ocupação de funções importantes previstas na estrutura da Polícia Militar, devidamente gratificadas, porém voltadas para prestação de serviços em outros órgãos do Governo.
     Nessas funções os policiais estão mais próximos do centro do poder o que lhes permitem, por exemplo, a obtenção de vantagens sobre seus concorrentes em promoções por merecimento, ou a indicação para cursos realizados fora do Estado, o que gera vantagens financeiras.  Muitas vezes os benefícios obtidos pelos que assim agem resultam prejuízos para os que, primando pelos princípios técnicos, se voltam para as atividades fins da corporação, exercendo funções operacionais. Não raro, casos desse tipo geram desestímulos, insatisfações, revoltas e quedas no rendimento operacional.
        Os policiais que se encontram em funções de natureza política, por uma questão de lealdade e pelo próprio comprometimento político-partidário que assumem, passam a adotar posturas aproximadas ao fanatismo. Entretanto, a dinâmica da democracia enseja a salutar alternância do poder e com ela essas funções passam a ser ocupadas por outras pessoas, igualmente partidárias, como é natural. Assim, vão se formando grupos ou facções políticas no interior da corporação.
      Quem assume função de confiança em um governo, mesmo que seja portador de boa qualificação profissional, passa a ser visto como adversário na gestão seguinte, o que implica na redução do seu espaço na administração e o consequente prejuízo para a corporação.
         Alguns chegam a passar anos sem exercer funções, por imposição ou opção, o que é contrário aos interesses da corporação.  Esses isolamentos dos “adversários” podem ser determinados pelos agentes políticos, ou partir dos diversos níveis de comando dentro da própria corporação.
       Essa é uma realidade muito antiga nas Polícias Militares de todo país, mas que nas últimas décadas ficou acentuada.  Como consequência desses fatos, na Paraíba muitos oficiais e praças, nos últimos vinte anos, se lançaram candidatos a cargos eletivos, inclusive três ex-comandantes. Tudo isso é válido considerando a importância da formação de uma representação política da Polícia Militar. Ressalte-se também que o prestígio político de um policial pode acarretar benefícios para a corporação.
    Entretanto, o grande desafio para quem governa e para quem comanda é desenvolver mecanismos capazes de evitar a prática de atos de revanche, de ódios e de discriminação aos ex-ocupantes de funções de confiança.  Isso pode ser iniciado com a redução das interferências políticas na corporação.  Não é tarefa para curto prazo, mas que urge ser iniciada, para o bem da Polícia Militar.
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2 Comentários em "Polícia e política: Dificuldades de adaptação de Oficiais e Praças de vocação técnica"

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Daniel Limeira dos Santos
Visitante
Parabéns pelo artigo Cel. Coerente, bem escrito, e que retrata a realidade. Infelizmente, desconheço exemplos dos que tiveram oportunidades políticas de trazer benefícios para a Polícia Militar, e o fizeram. A regra tem sido aproveitar o máximo das benesses para si mesmos. Parabéns também pelo blog. Já possuo um blog (http://danielgestoraprendente.blogspot.com.br/) que trata de assuntos ligados a gestão e educação, considerando que estou fazendo mestrado nessa área. Também pensei em criar um blog só para tratar de assuntos de polícia militar, e o nome que me veio à mente foi justamente “A Briosa”, por isso comecei a verificar a existência… Leia Mais »
coronel batista
Visitante

Obrigado amigo. Fico feliz com seus comentários. Agradeço a sugestão para postar artigos com dados biográficos de Policiais, da ativa e da reserva. Já pensei nisso e estou trabalhando alguns dados. Em breve estarei publicando matéria com conteúdos dessa natureza. Alias, já temos alguns artigos que tratam desse assunto. Mas vou ampliar. Ficamos às suas ordens.