O Ciclo Completo de Polícia

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A Lei 9.099, de setembro de 1995, que criou o Juizado Especial e definiu que nos casos de crime de baixo poder ofensivo a lavratura de Inquérito foi substituído pela elaboração do Termo Circunstanciado de Ocorrência, essa questão ganhou outra dimensão.  
      Segundo relatos prestados no 15º Encontro Nacional das Entidades dos Militares Estaduais, realizado em Natal, nos dias 26, 27 e 28 de agosto de 2015, por representantes dos Policiais Militares de diversos Estados, a capacidade preventiva da atuação das Guarnições de Rádio Patrulha, em todo Brasil, está sensivelmente prejudicada pelo tempo empregado no atendimento de ocorrências em que há necessidade de confecção do TCO.  Segundo ainda esses relatos, é comum uma Guarnição fazer longos deslocamentos conduzindo pessoas envolvidas em crimes de menor potencial ofensivo e passar horas nas Delegacias no aguardo da confecção do TCO. Com isso as Guarnições ficam afastadas de suas áreas de atuação, portanto, sem cumprir a sua finalidade básica que é a execução do policiamento preventivo.
    Fatos dessa natureza são comuns nos grandes centros urbanos, principalmente no período noturno e nos fins de semanas, quando muitas Delegacias deixam de funcionar, o que aumenta os deslocamentos das Guarnições e o tempo empregado em ocorrência desse tipo, exatamente nos momentos em que é maior a necessidade do policiamento ostensivo.
    Mas nas pequenas cidades o problema é mais grave, uma que vez em muitos Municípios não tem Delegado em caráter permanente o que obriga as Guarnições de se deslocarem para outras cidades, percorrendo, por vezes, dezenas de quilômetros, deixando suas cidades sem o serviço policial.
    Por outro lado, o tempo empregado pelas Delegacias para a confecção dos TCO, reduz a capacidade de a Polícia Civil proceder aos trabalhos de investigações dos crimes de maior gravidade, como, por exemplo, os homicídios, que no Brasil tem uma média de resolução abaixo de 8%, o que significa que, em tese, 92% dos autores de homicídios ficam completamente impunes. Esse, por certo, é um dos mais relevantes fatores da criminalidade no Brasil.
    Por esses motivos as entidades representativas dos Policiais Militares e Corpo de Bombeiros Militares de todo o Brasil, vêm se articulando e atuando no Congresso Nacional para aprovação da PEC 423/2014, que estabelece, entre muitas outras mudanças no sistema policial, a adoção do Ciclo Completo de Polícia, ou seja, permite que a Polícia Militar também possa desenvolver atividades de Polícia Judiciaria, e a Polícia Civil também fazer o policiamento ostensivo.
     Com a aprovação dessa PEC, o TCO será elaborado pelos Comandantes de Guarnições.  O atual nível de escolaridade dos policiais militares é perfeitamente compatível com essa atividade.  Assim, a Polícia Civil ficará com mais disponibilidade para investigar os crimes mais graves, o que possibilitará o aumento do índice de resolução desses delitos, em particular dos homicídios.    Por outro lado, a Polícia Militar, mesmo fazendo o TCO, ficará com mais disponibilidade para efetuar suas atividades preventivas.
      A autorização para as Guarnições das Polícias Militares confeccionarem os TCO é apenas uma parte dessa proposta. Nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, os TCO já são feitos pela PM há mais de dez anos. Essa medida, que no início foi contestada pela Polícia Civil, foi objeto de apreciação dos Tribunais Superiores, onde teve decisão favorável e atualmente tem grande credibilidade por parte da Justiça, Ministério Público, e da sociedade.
      A PEC 423 introduz muitas modificações no sistema policial que afetam diretamente as Polícias Militares e os demais órgãos integrantes da Segurança Pública, como por exemplo:
    - Permite às policiais atuar como mediadora de conflitos nos casos de danos civis decorrentes de ocorrência de menor potencial ofensivo;
     - Autonomia administrativa, funcional e financeira para as Políciais;
     - Autorização para as Guardas Municipais exercerem o policiamento ostensivo;
     -A unificação progressiva das polícias;
     -Ampliação da competência dos Corpos de Bombeiros;
     -Autonomia das perícias;
     -Vinculação de receitas destinadas à segurança pública;
     -Mudanças de denominação da Polícia Militar e do Copo de Bombeiros.
   Mas, independente de aprovação dessa PEC, em alguns Estados, como já mencionado, as Polícias Militares já estão fazendo o TCO.
      Na Paraíba a legislação já permite essa atividade desde o ano de 2009, quando a Lei Complementar nº 87, no seu artigo 4º, ao estabelecer a competência da Polícia Militar, assim estatui no inciso XXIV:
         XXIV – lavrar, subsidiariamente, o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO);
         Na forma do artigo 69 da lei 9.090, quem deve elaborar o TCO é a autoridade Policial, o que tem dado margem a diferentes interpretações a alguns dispositivos do Código de Processo Penal, e ao sentido teleológico da Lei 9.099, que tem como princípio norteador a celeridade.  No § 1º do artigo 4º da Lei Complementar 87, fica definido que “os integrantes da Polícia Militar da Paraíba, no desempenho de atividade policial militar no âmbito de suas responsabilidades, são considerados autoridades policial militar”.
       No inciso VII do artigo 4º da Lei aqui mencionada, fica também atribuída à Policia Militar a competência para exercer a polícia administrativa do meio ambiente, o que também é uma forma do que nominamos de Polícia Judiciária.
      Assim, a Polícia Militar da Paraíba está legalmente autorizada a confeccionar o TCO.  Ocorre que a adoção dessa medida contraria interesses corporativos dos Delegados e por consequência do Secretário de Segurança, o que limita a capacidade de iniciativa do Comandante Geral nesse sentido. Essa é uma atitude até certo ponto compreensível tendo em vista que a função de Comandante Geral é política, portanto condicionada a interesses nem sempre favoráveis à corporação.   Essa situação ocorre em diversos Estados, onde, na maioria os Secretários de Segurança são Delegados da Polícia Federal.  
        Por esse motivo as atividades das entidades representativas dos policiais militares alcançam elevada importância à medida que lutam em defesa dos interesses das Polícias Militares de forma autônomas e desvinculadas de políticas partidárias.   São muitas as entidades que estão trabalhando nesse sentido a exemplo da Federação Nacional das Entidades dos Militares Estaduais (FENEME), criada em 2007, e que congrega 43 entidades estaduais representadas por mais de quarenta mil sócios, (ativos e inativos) em todo o Brasil. A FENEME atua em pareceria com o Conselho Nacional dos Comandantes Gerais das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares, e desenvolve um intenso trabalho junto aos Parlamentares no Congresso Nacional.  Além da PEC 423, a FENEME acompanha todas as demais PECs e os projetos de Leis que tramitam no Congresso Nacional (a exemplo da Lei Orgânica das Polícias Militares) e que tratam de questões do interesse das Polícias Militares.
      Assim, é estranho que essas questões não estejam sendo discutidas no âmbito da Polícia Militar da Paraíba, de forma aberta, ou mesmo restrita, mas sistemática e objetiva, o que, infelizmente, é uma realidade desde o inicio da década de 1990.     
 PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 423  DE 2014
 
Art. 1º Esta Emenda Constitucional altera dispositivos da  Constituição Federal para criação de policia única, de ciclo completo, num novo sistema de segurança pública.
Art. 2º A Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte
redação:
Art. 23 – (Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios)
......................................................................
...................:
..................................
...............................................................
...
XII
– executar a fiscalização de trânsito nas vias públicas, por meio
dos respectivos órgãos ou entidades executivos, integrados por agentes organizados em carreira, compreendendo as atividades de educação, engenharia e fiscalização de trânsito
.
........................................................................................................
Art. 98 (Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
  - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumariíssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;)
.......................................................................................
§ 3º A policia poderá, nos termos da lei, realizar a composição
preliminar dos danos civis decorrentes das ocorrências de menor potencial ofensivo;
..........................................................................................................
Art. 129.( Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;)
............................................................................................
.........................................
................................................................
VIII – requisitar a instauração de procedimento apuratório e diligências nos crimes de ação penal pública, que deverão ser encaminhados diretamente ao Ministério Público.
Art. 144 – (Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:)
............
..........................
§ 6º  - Os órgãos  e instituições de segurança previstos nos incisos do caput deste artigo dotados de autonomia administrativa, funcional e financeira, e dotação orçamentária própria, subordinam-se diretamente aos respectivos governadores, e os do Distrito Federal e territórios e os federais ao Presidente
da República;
........
§ 8º - Os municípios poderão constituir guardas municipais, organizadas em carreira, nos termos da lei, destinadas  à proteção de seus bem serviços e instalações municipais, e nos termos da lei complementar exercer ações de patrulhamento ostensivo, sem prejuízo da atuação dos demais órgãos públicos  na esfera de suas competências;
§ 9º Aplica-se aos servidores policias dos órgãos de segurança  pública o previsto no art. 39, § 4º, art. 40,§4º e art. 37, XVI; §10. Além das competências específicas, os órgãos e instituições policiais previstos nos incisos do caput deste artigo, realizarão a polícia única, consistente no ciclo completo de ação policial na persecução penal, exercendo cumulativamente as polícias administrativa, ostensiva, preventiva, investigativa, judiciária e de inteligência policial, sendo as atividades investigativas, na ação penal pública, independente da sua forma de instrumentalização, realizada em coordenação com o Ministério Público;
§ 11 -  Além das competências específicas aos corpos de bombeiros incumbe exercer o ciclo completo da atividade de bombeiros que compreende, no seu âmbito:
- planejar, coordenar, e executar as ações de defesa civil, além  dos serviços de prevenção, extinção e apuração das causas de incêndios, de busca e salvamento, de resgate e atendimento pré-hospitalar e de emergência;
§ 12 -  Ato conjunto do Poder Executivo, do Poder Judiciário e do Ministério Público, poderá criar força tarefa temporária, de coordenação conjunta, para atuar na redução da incidência criminal e nos crimes de grande repercussão social;
§13 - A perícia, organizada em carreira, nos termos da lei, é assegurada a autonomia administrativa, financeira e independência funcional;
§ 14 - O ingresso na carreira dos órgãos e instituições de segurança pública será regulado em lei específica de cada  ente da federação, e os cargos e funções de confiança serão classificadas e exclusivamente ocupadas por membros da carreira do órgão que desempenham atribuições correspondentes, seguindo critérios meritocráticos e de antiguidade nas especialidades.
Art. 3º
O artigo 167 da Constituição Federal passa a vigorar com a
seguinte redação:
“Art.167(Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar)..................................
...............................................................
IV - a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para a manutenção e desenvolvimento do ensino, para as ações de segurança pública e para a realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2º, 212, 144, § 9º e 37, XXII, e a prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita, previstas no art. 165, § 8º, bem como o disposto no §  4º deste artigo;
 ................................................................................
Art. 4º - Esta Emenda entra em vigor na data da sua publicação, tendo os entes federados o prazo de até dois anos para a implantação da polícia única de ciclo completo, previsto no § 10, do art. 144, de maneira progressiva e mitigada, iniciando pelas infrações penais de menor potencial ofensivo e nos casos de prisão em flagrante.
Art. 5º As instituições abaixo nominadas passam ater a seguinte denominação:
     § 1º As polícias militares passam a ser denominadas forças públicas estaduais e do Distrito Federal e Territórios.
§ 2º - Os corpos de bombeiros militares passam a ser denominados corpos de bombeiros dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
 

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