A extinção e o ressurgimento da polícia: a Fênix dos nossos dias

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        Aurélio Nascimento, colunista do site extra.globo.com, escreveu recentemente um bem articulado e criativo texto projetando, com muita engenhosidade, como seria o mundo sem polícia. Segundo ele, o artigo foi inspirado em um documentário exibido pelo canal “History Channel” no qual se projetava como seria o universo sem o homem.

      Aurélio toma como base a situação do Rio de Janeiro e imagina como seria o mundo em diferentes momentos a partir da extinção da polícia.

     Nessa visão ficta de Aurélio, nas primeiras horas após o fim da polícia nada aconteceria de anormal uma vez que as pessoas ainda não acreditavam nessa extinção. Na segunda semana começaria a se intensificar a prática de pequenos delitos como as infrações de trânsito, e retirada de mercadoria das lojas sem pagar, com os delinquentes agindo com calma, pois não tinha ninguém para prendê-los.

     Depois de um mês a justiça praticamente deixava de existir porque não tinha como suas decisões serem executadas. A partir do sexto mês o número de homicídios se multiplicaria de forma ainda mais assustadora. Depois de um ano as ruas, bairros e cidades estavam dominadas por grupos armado e as pessoas não tinham como evitar esse domínio, pois não tinha a quem recorrer e nem onde se refugiar. Nesse mesmo período o dinheiro deixaria de circular por falta de garantia do seu valor. No ano seguinte o comércio deixaria de existir. Volitar-se-ia ao escambo. A regularidade seria o roubo, a extorsão e o homicídio.

      Dez anos depois da extinção da polícia a sociedade se encontraria totalmente esfacelada. No vigésimo ano após o fim da polícia deixaria de existir limites e divisas com o fim dos Municípios e Estados e a sociedade seria dominada por grupos armados que controlariam a água, a comida o agasalho e demais gêneros de primeira necessidade, que ficariam acessíveis apenas aos que pudessem conseguir pela violência.

     Aqui apenas sintetizamos o que foi exposto no artigo de Aurélio Nascimento apenas para se ter uma ideia do seu  conteúdo. Parece-nos que ele foi otimista ao prolongar tanto o desfecho da tragédia que foi projetada, pois não acredito que a sociedade suportasse um ano sem polícia. Mesmo que as ideias tenham sido levantadas apenas através de uma hipótese, perfeitamente factível, o texto expõe, de forma evidente, o valor da polícia para a harmonia social.

       Mas aqui pretendemos fazer uso do quadro traçado por Aurélio para, também de forma hipotética, tentar ver a continuidade desse cenário com o consequente ressurgimento da polícia.  É o que buscamos fazer a seguir, o que nos leva a uma pequena digressão.

       Em diferentes momentos da história, diversos pensadores procuraram explicar a origem do Estado como forma de sociedade civil, que para eles surgiu de um pacto firmado entre indivíduos que viviam em estado de natureza, cujo conceito era diferente para cada um desses pensadores que ficaram conhecidos como contratualistas e entre os quais destacaram-se: Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rousseau.

      Alguns desses autores, apesar de descreverem um "estado de natureza",  admitiam que tal estado possa nunca ter existido, mas que era preciso fazer essa construção para entender a formação da sociedade civil. Para Hobbes o "estado de natureza" é qualquer situação em que não há um governo que estabeleça a ordem e no qual as ações dos indivíduos estariam limitadas apenas por seu poder e sua consciência. Para Locke, o estado de natureza não foi um período histórico, mas é uma situação que pode existir independentemente do tempo.

   Percebe-se, portanto, que o quadro traçado por Aurélio, no texto aqui comentado, se assemelha à situação definida por Hobbes como um estado natural.

      Para Hobbes nessa situação os indivíduos lutavam entre si, o que ele chamava de guerra de todos contra todos, o que configura o quadro traçada por Aurélio.  Para Rousseau e Locke não havia essa guerra e os indivíduos buscavam a colaboração. Um ponto abordado pelos contratualistas, com algumas divergências, era a ideia de que os indivíduos nessa situação gozavam de plena liberdade, mas não podiam exercê-la, pois faltavam meios para garanti-la.  Por essa razão teria havido um acordo entre esses indivíduos, o que essas teorias denominaram de contrato. Nesse pacto cada indivíduo cedeu uma parte de suas liberdades entregando-a a um ente fictício, que depois foi denominado de Estado, para que este promovesse a garantia da liberdade de todos. Portanto, a necessidade de segurança fez nascer o Estado. Para Hobbes “a origem das sociedades amplas e duradouras não foi a boa vontade de uns para com os outros, mas o medo recíproco”.

       E ainda de acordo com essas teorias, para que o Estado pudesse cumprir esse papel, ou seja, garantir a segurança das pessoas e o bem estar de todos, teria recebido também desse pacto, o poder de fazer uso da força para garantir a ordem entre os indivíduos. Assim, na forma dessas teorias, a função primordial do Estado é garantir a ordem publica.

    Portanto, vindo a acontecer a hipótese descrita no texto de Aurélio, por certo ocorreria um novo pacto social, dando origem ao ressurgimento do Estado e com ele o ressurgimento da polícia como prioridade para restabelecer a ordem.   Não pode haver civilização sem polícia.

  Assim, como a Fênix, a águia da mitologia que ao ver se aproximar a sua morte se atirava no fogo e ressurgia das cinzas, a polícia sempre irá ressurgir, por maiores que sejam os obstáculos que venha a enfrentar.

 

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